A Limpeza de Lívia


É de manhã, os raios de sol entram pela janela entreaberta e se refletem em pequenos estilhaços de um espelho quebrado no chão. Na cama, o sangue pinta de vermelho o lençol branco e escorre pelo corpo nu de Lívia. Será vermelha a cor da “limpeza”?

Lívia, uma moça de 18 anos, morava sozinha num antigo apartamento herdado de seu falecido avô. Era uma menina triste que odiava o convívio em sociedade e só tinha uma única amiga. Se achava feia, estranha e não queria mais se alimentar.

Sua ocupação era limpar os objetos incansavelmente, pois pensamentos obsessivos e compulsivos perturbavam a sua mente. Ela tinha “TOC”, cumpria rigorosamente diversos rituais de limpeza durante o dia e quando se sentia mal e triste, isso na maioria das vezes, Lívia costumava se cortar com cacos de vidro, uma forma de “limpeza” e alívio para ela.

Trancada em seu apartamento, ela se isolava da sociedade e mergulhava cada vez mais no seu mundo depressivo e obsessivo. As mãos de Lívia eram ásperas e enrrugadas, nos seus braços havia muitos cortes abertos e curativos feitos com fita adesiva. O seu rosto tinha queimaduras resultantes do exagero de sabonete e de cremes cosméticos. Lívia aparentava ser bem mais velha.

Anita, sua única amiga, sempre ia visitá-la nas manhãs de terça. Juntas elas se divertiam ouvindo músicas em som alto, bebendo vinho, usando drogas e conversando. Anita tentava animar Lívia, tentava fazer ela sair de casa. Mas Lívia não queria, sentia medo das pessoas, dos olhares avaliadores e críticos dos desconhecidos.

Numa noite de segunda, a triste menina se desespera. Pega um pedaço de papel e escrevi um bilhete, coloca-o na sua estante e depois começa a chorar olhando para o imenso e velho espelho de seu quarto. O rádio estava ligado e tocava a música No surprises do Radiohead. Lívia pega uma corda no banheiro, a amarra no canto superior do espelho, joga a corda por cima do antigo lustre no teto e começa a suspender o pesado espelho. Ela se senti muito depressiva e suja, mais do que nos outros dias.

Lívia está nua e segura firme a corda. Deitada na sua cama começa a pensar num ato de purificação eterna, de “limpeza” absoluta. No espelho pendurado, um olhar morto e angustiante se reflete. Num momento desesperador, a menina olha para um salto vermelho que nunca havia usado. Com uma das mãos joga um livro pesado contra o espelho e solta a corda. Uma chuva de vidros “limpou” a doce e frágil menina para sempre.

Terça de manhã, Anita bate na porta do apartamento de Lívia e ninguém responde. Anita se desespera e decide arrombar a porta. Entra no quarto, fica chocada com a cena que vê e começa a chorar. O corpo de Lívia estava todo cortado por estilhaços de vidro, o sangue escorria pela cama e na estante havia um bilhete embaixo do salto vermelho.

No bilhete estava escrito: "Me desculpe Anita por fazer desperdiçar o tempo de sua vida com uma pessoa tão suja, triste e insignificante como eu. Será vermelha a cor da “limpeza”?”

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